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Diversas

Pandemia, demora em emissão de CBios, impasse sobre metas: usinas avaliam 1º ano de RenovaBio
Publicado em 04/01/2021 às 10h08
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Demora na emissão de créditos de descarbonização (CBios), redução de 50% nas metas causadas pela pandemia da Covid-19 e impasse com distribuidoras estão entre os desafios apontados pelo setor sucroenergético no primeiro ano de implantação do RenovaBio, a Política Nacional de Biocombustíveis, que começou a valer em 2020.

Os impactos no consumo de etanol, por conta das medidas de isolamento social, da guerra comercial entre Rússia e Arábia Saudita, e demandas como a redução no diesel e fertilizantes na produção de cana-de-açúcar também são citados por produtores entrevistados pelo G1.

Lançado como parte do cumprimento das metas do Acordo de Paris, em 2015, o RenovaBio estabeleceu uma meta inicial de redução de 28,7 milhões de toneladas de carbono para este ano, objetivo que foi cortado pela metade e cumprido em novembro pelos produtores de biocombustíveis de todo o país, com mais de 15 milhões de toneladas.

"Foi um ano de aprendizado para todos os agentes: produtores, certificadores, distribuidores e ANP. Mas o RenovaBio já está em pleno funcionamento. A pandemia levou o governo a rever as metas deste ano, reduzindo-as a 50% das metas iniciais, o que foi feito mediante ampla consulta pública, aberta a todos os agentes da cadeia", afirma Eduardo Leão, diretor executivo da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica).

Das 270 usinas de etanol do Centro-Sul, em que se inserem grandes regiões sucroenergéticas como Ribeirão Preto (SP), 209 obtiveram autorização para emitir CBIOs, documentos que atestam a redução na emissão de carbono e que já somam R$ 685 milhões em títulos negociáveis na Bolsa de Valores (veja a projeção mês a mês abaixo).

"Sem dúvida é o maior programa de descarbonização da matriz de transportes do mundo, não tem nada igual com esse nível de ambição", diz.

RenovaBio: entenda

O que é: mais conhecida como RenovaBio, a Política Nacional de Biocombustíveis foi instituída por uma lei sancionada pelo então presidente Michel Temer no final de 2017 e foi regulamentada ao longo do primeiro ano da gestão Jair Bolsonaro para entrar em vigor em 2020;

Qual é o objetivo: o programa foi criado com o intuito de reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa na matriz energética brasileira, um dos compromissos assumidos pelo país no Acordo de Paris durante a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP21) em 2015;

Como funciona: para o cumprimento dessa meta, a política nacional estabeleceu um mercado de créditos de descarbonização, os CBios, títulos registrados em bancos e negociados na Bolsa de Valores emitidos por produtores de biocombustíveis junto à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), para toda venda de produtos como etanol e biogás para as distribuidoras. Estas, por sua vez, devem adquirir esses títulos como compensação pela comercialização de combustíveis fósseis;

Como aderir ao programa: primeiro, usinas e produtores de biocombustíveis precisam estar credenciados por empresas nacionais e estrangeiras de acreditação, como a ABNT, em um processo disponível para consulta pública por 30 dias; entre auditorias e adequações, estima-se que o processo de certificação, válido por três anos, para uma usina custe entre R$ 50 mil e R$ 200 mil, segundo representantes do setor sucroenergético. Até o início de novembro havia pelo menos 232 produtores de etanol, biodiesel e biogás credenciados para o RenovaBio em todo o país.

Como se calcula o CBio: a partir de então, cada tonelada de carbono que deixa de ser emitida na produção equivale a 1 CBio obtido pela indústria. Esse cálculo é feito com base em uma Nota de Eficiência Energético Ambiental (NEEA) que leva em conta a quantidade de biocombustível produzida pelas indústrias e a sustentabilidade da produção, como o baixo uso de combustíveis fósseis em maquinário agrícola e de fertilizantes nitrogenados, prejudiciais ao meio ambiente, na lavoura. A Embrapa desenvolveu uma calculadora própria para isso; para se ter uma ideia, a gasolina emite 87 gramas de CO2 por unidade de energia, enquanto o etanol, de 20 a 22 gramas, em média.

Quanto vale 1 CBio: desde que começou a ser negociado na Bolsa de Valores, o crédito de descarbonização tem sido negociado, em média, entre R$ 15 e R$ 62, segundo valores registrados entre junho e novembro.

Quem pode adquirir: além de distribuidoras de combustíveis, obrigadas a adquirir os créditos de acordo com a característica de seus negócios, os CBios podem ser comprados por investidores em geral e são negociados na Bolsa;

Meta de descarbonização: desde o início do programa, o número de CBios gerados pelos produtores de biocombustíveis registrados na Bolsa superou os 15 milhões, acima da meta reduzida para 2020 estabelecida pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que era de 14,998 milhões. Do total, 7,6 milhões de créditos tinham sido adquiridos pelas distribuidoras em novembro.

Pandemia

A pandemia da Covid-19, sem dúvida, foi o primeiro grande desafio do setor sucroenergético e outros produtores de biocombustíveis.

Em um cenário de redução drástica no consumo de combustíveis, atrelada ao confinamento da população e ao fechamento das atividades econômicas no início do primeiro semestre, os responsáveis pelo RenovaBio tiveram que reduzir as metas de emissão de CBios, que inicialmente eram de 28,7 milhões de CBios, pela metade.

"Isso foi uma adaptação. O que teve na pandemia foi uma redução drástica da demanda de etanol, não só de etanol como de gasolina, porque veio o confinamento. O confinamento levou a que se tivesse uma redução drástica no uso de combustíveis aqui. Isso afetou a demanda e naturalmente afetou a comercialização de etanol", afirma Jacyr Costa Filho, membro do comitê executivo do grupo Tereos, com usinas em localidades como Pitangueiras (SP), Guaíra e (SP) e Colina (SP).

Cenário que começou a mudar, segundo ele, com a retomada das atividades econômicas, com volumes ainda inferiores do que 2019, mas mais expressivos no consumo de etanol a partir de setembro. "Aos poucos, com o término do confinamento e o início gradual da retomada da economia, o mercado de combustíveis e particularmente de etanol está sendo retomado."

Empresas como a Biosev, com unidades e cidades como Sertãozinho (SP), Morro Agudo (SP), Jaboticabal (SP) e Colômbia (SP), também reconhecem o peso da pandemia, mas apontam ganhos de produtividade ainda no primeiro trimestre do ano, com uma moagem 7% maior do que na safra anterior e uma receita líquida 14% maior mesmo com a chegada da pandemia.

"A pandemia de Covid-19 estabeleceu um cenário desafiador para todas as companhias. Podemos dizer que para a Biosev foi um ano positivo no assunto RenovaBio porque certificamos nossas oito unidades agroindustriais", afirma o presidente Juan José Blanchard.

Emissão de CBios: burocracia

Com ao menos três usinas de cana na região de Ribeirão Preto, o grupo Tereos certificou todas as suas plantas industriais para o RenovaBio até abril deste ano, além de estimular o mesmo procedimento para fornecedores, afirma Costa Filho.

O processo de certificação, segundo o membro do comitê executivo da empresa, não foi um problema porque o grupo já tinha expertise própria para processos de certificação. Por outro lado, considera o registro dos créditos de descarbonização na ANP um entrave e acredita que as negociações poderiam ser menos burocráticas.

Segundo ele, o reconhecimento do CBIO na agência chega a demorar dez dias porque o órgão demanda uma confirmação de envio do combustível por parte da distribuidora, processo já registrado em nota fiscal pela usina no carregamento dos caminhões.

Até o final da safra 2021/2021, a empresa espera emitir em torno de 800 mil CBios.

"A ANP exige que a distribuidora confirme que recebeu aquele etanol. Isso está causando um atraso nas negociações de CBIOs, porque esse tempo para a distribuidora confirmar às vezes leva até dez dias, o que é uma bobagem, porque a usina já carregou o caminhão que foi enviado pela distribuidora, então, não tem sentido", afirma.

Procurada, a ANP informou que, para a Nota Fiscal ser aceita para fins de emissão de Créditos de Descarbonização, precisa ter a confirmação do recebimento pelo destinatário para se evitar a emissão de Créditos de Descarbonização (CBIOs) indevidos. "O objetivo é ter uma maior segurança na validação da operação comercial evitando a geração de CBIOs a partir de vendas de biocombustíveis não recebidos pelos destinatários".


Impasse com distribuidoras

Outro desafio é um impasse com as distribuidoras em relação às metas de compra dos CBIOs. O programa estabelece cotas para as distribuidoras de acordo com a participação delas no mercado e a proporção de combustíveis fósseis na sua composição de negócios.

"A lógica do programa é que quem vende mais combustível fóssil tem que comprar mais títulos de descarbonização", explica Eduardo Leão.

O assunto, segundo a Única, foi parar na Justiça, onde a Associação de Distribuidoras de Combustíveis (Brascom) questionou o cumprimento da redução de emissões de gases do efeito estufa e chegou a obter uma redução de 25% nessas metas.

Em decisão recente, o Tribunal Regional Federal (TRF1) derrubou uma liminar favorável à entidade.

Procurada, a Brascom explicou que é apoiadora do RenovaBio desde sua concepção, inclusive com estudos e sugestões para o programa. Por outro lado, considera pequeno o prazo estabelecido para as distribuidoras comprarem os CBios, mediante demora na definição das metas individuais das distribuidoras, que saiu em setembro.

"É neste momento que nos encontramos, pressionados a adquirir em menos de três meses o que deveria ter sido disponibilizado em seis", comunica.

Além disso, aponta que havia em torno de 6 milhões de CBios ainda não disponibilizados para negociação por parte dos emissores.

Perto do fim do ano, o setor adquiriu somente 50% do estabelecido - o equivalente a 7,6 milhões de créditos, com um desembolso de R$ 18,5 milhões. A entidade também defende mudanças para que o etanol hidratado e outros biocombustíveis tenham o mesmo tratamento tributário que os combustíveis fósseis.

"Como princípio, as metas partiram de premissas que consideramos erradas, como, por exemplo, exigir que as distribuidoras fossem obrigadas a adquirir os CBIOs, enquanto os emissores destes ficaram sem a obrigação de oferecê-los à venda, gerando desequilíbrio entre a oferta e a demanda, e tendo como resultado o aumento de mais de 200% no preço de comercialização dos CBIOs. Este impacto irá, por conseguinte, irá pesar, mais uma vez, no bolso dos consumidores", critica.

De acordo com a ANP, as metas anuais foram estabelecidas pela Resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) 08/2020 até 2030 e qualquer alteração necessária será objeto de avaliação pelo Comitê Renovabio, que assessora o órgão.

"Apesar dos impactos da pandemia, o RenovaBio tem demonstrado êxito até o momento. Já foram emitidos CBIOs em quantidade suficiente para o cumprimento da meta estabelecida para o ano de 2020 (aproximadamente 16 milhões de CBIOs já foram emitidos), sendo que aproximadamente 60% já foi adquirido pelas distribuidoras de combustíveis", afirma a agência.


Eficiência energética

Afora a produção de etanol em si, a sustentabilidade em torno dos processos para que a cana seja transformada em combustível ainda representa um desafio para o setor. Um aspecto que reflete diretamente na nota de eficiência energética ambiental (NEEA) atribuída às usinas e é essencial para a contabilização dos créditos de descarbonização.

"A certificadora vai à usina, coloca todas as informações com base no desempenho dela, o tanto de utilização de insumos etc, e no final vai dar uma nota para aquela usina. Cada usina vai ter o seu desempenho, a sua nota com relação a quanto é capaz de reduzir de emissões", afirma Eduardo Leão, diretor executivo da Única.

Em grupos como a Biosev, com oito usinas credenciadas para o programa desde junho, o impacto ambiental da produção passou a ser uma avaliação de rotina.

"Esse levantamento é parte do processo de gestão e controle diário da empresa. Chamamos uma empresa credenciada junto à ANP que realizou todas as verificações dos nossos processos e recebemos uma nota de eficiência energética, emitida pela ANP, que vai determinar quantos litros de biocombustível são necessários para evitar a emissão de uma tonelada de CO2 na atmosfera", afirma o presidente Juan José Blanchard.

Segundo Costa Filho, do comitê executivo do Grupo Tereos, ganhar eficiência energética significa reduzir ainda mais o uso de diesel em maquinário agrícola e fertilizantes nitrogenados na produção.

"Esses dois fatores são muito fortes, porque são os que têm maior impacto ambiental. O diesel, pela poluição que causa, é um combustível fóssil, como hoje a gente faz todo o nosso corte mecânico então o diesel pesa", explica.
Rodolfo Tiengo
30/12/2020
Fonte: g1
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