União Nacional da Bioenergia

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Incêndios que destruíram canaviais em 2024 impactam a próxima safra de cana
A grande dúvida ainda é a produtividade, afirmam analistas
Publicado em 28/01/2025 às 16h30
Foto Notícia
A semana de 19 a 25 de agosto de 2024 vai ficar para a história como a “semana do fogo” para os produtores paulistas. Nesse intervalo, São Paulo registrou 2.835 focos de incêndio, o que correspondeu a quase 40% de todos os casos que ocorreram no estado no segundo semestre, segundo os registros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Na maior parte dos casos, o fogo devastou milhares de hectares de lavouras de cana-de-açúcar.

O episódio marcou não apenas a safra 2024/25, que começou em abril de 2024 e termina em março de 2025, como também deixa suas heranças para a temporada de abril de 2025 em diante, a 2025/26. Ela terá implicações na oferta total de cana e de seus subprodutos, como açúcar, etanol e a energia gerada a partir da queima do bagaço.

Estimativas da Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), que representa os produtores independentes do Centro-Sul, indicam que os incêndios atingiram 414.000 hectares de lavouras de cana em todo o país. A colheita dos pés de cana já havia terminado em metade dessa área, e as soqueiras estavam começando rebrotar, ou já haviam começado, para a colheita do ano que vem. Mas o fogo interrompeu esse processo.

Os técnicos ainda fazem as contas para saber quais áreas precisam de replantio e quais conseguem rebrotar e render novas colheitas nos próximos anos. “Já houve quem começasse o replantio, algumas que foram deixadas para rebrotar, e ainda há talhões em que a situação ainda não está definida”, diz Willian Hernandes, sócio da consultoria FG/A, de Ribeirão Preto (SP).

O tempo seco também dificultou a recuperação das lavouras. “A seca foi tão intensa que canaviais novos, de segundo, terceiro e quarto cortes, simplesmente não brotaram”, relata Cláudio Monteiro, químico da empresa de fertilizantes Massari. Os incêndios foram, a propósito, resultado da longa estiagem e da combinação de outros fatores, conhecida como “triplo 30”: temperaturas acima de 30ºC, ventos acima de 30 quilômetros por hora e umidade relativa do ar abaixo de 30%.

O fato é que só de haver mais áreas de replantio do que o normal já implica em uma redução da área de colheita na próxima safra. Afinal, os locais que estão recebendo novas mudas só vão gerar pés maduros para a colheita de 2026, passando pelo estágio de crescimento vegetativo ao longo de 2025. De forma geral, produtores e analistas estimam que a área de colheita de cana vai diminuir na safra 2025/26.

A própria Orplana prevê que a próxima temporada do Centro-Sul terá 187.000 hectares de área disponível para colheita a menos, o que reduzirá o total para 7,6 milhões de hectares. Segundo José Guilherme Nogueira, presidente da entidade, a diferença representa a área que terá que ser replantada por causa dos incêndios.

As projeções da dimensão da área “perdida” para o replantio variam. O Rabobank, por exemplo, estima que o número pode ser maior, de mais de 200.000 hectares. Ao mesmo tempo, o analista de açúcar e etanol do banco holandês, Andy Duff, acredita que alguns produtores de grãos podem estar em processo de migração para o cultivo de cana.

Outro fator que ainda pode alterar a porção de área da próxima safra “perdida” para a rebrota é o custo=benefício de deixar terras sem produzir em um momento de preços remuneradores, especialmente os de açúcar. “Essa decisão não é fácil, porque pode haver uma rebrota com qualidade boa, mas o produtor só vai descobrir isso em abril (de 2026). E, para replantar, ele precisa usar parte do canavial que seria cortada agora”, observa Hernandes, da FG/A.

A grande incógnita ainda é a produtividade. Depois das chuvas de outubro e novembro, que acumularam volume acima da média em várias regiões produtoras do Centro-Sul, há quem aposte em recuperação em comparação com a safra 2024/25. Mas cautela nunca é demais. “Olhando para a condição do canavial na mesma época do ano passado (2023), há uma perspectiva de produtividade melhor. Se ocorrer uma seca em janeiro, isso pode se reverter? Pode”, indica Fabio Marin, professor da Esalq/USP e coordenador do Sistema Tempo Campo.

Ele ressalta que, mesmo que a produtividade não volte ao patamar de2023/24, os níveis ainda são histo-ricamente altos. Na safra 2023/24,quando o clima foi “perfeito” para a cultura, a produtividade do Centro-Sul chegou a 88,2 toneladas por hectare, e, em 2024/25, com o impacto da seca e dos incêndios, o rendimento foi de 79,8 toneladas por hectare, estima a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab). Mesmo que tenha caído quase 10%, a média ainda foi superior à dos últimos 20 anos, de 78,1 toneladas por hectare.

Se a produtividade da safra 2025/26 ficar na média histórica, a moagem de cana do Centro-Sul deve ficar perto de 600 milhões de toneladas, estima a FG/A. Mas as projeções no mercado ainda variam bastante. O Rabobank tem uma visão um pouco mais pessimista e estima que a moagem deve ficar mais próxima de 580 milhões de toneladas, já que o banco vê a possibilidade de uma nova queda de rendimento.

As perspectivas climáticas indicam um La Niña enfraquecido neste verão, ou até de neutralidade (sem La Niña nem El Niño), o que não é má notícia para a cana. Para Hernandes, da FG/A, o período crítico para a definição do potencial produtivo dos canaviais concentra-se não durante o pico do verão, mas mais adiante. “O que muda o potencial da safra ocorre depois do fim do verão, nos meses de março, abril e maio”, pontua.

Com mais ou menos cana disponível para as usinas, a produção do açúcar deve até aumentar. Primeiro, porque as usinas estão com mais capacidade de cristalização de açúcar; segundo, porque o produto continua oferecendo uma remuneração melhor do que o etanol. No fim de 2024, o preço do açúcar gerava uma renda para as usinas entre 20% e 30% maior do que o biocombustível, segundo a FG/A.

Toda essa conjuntura tende a fazer com que a produção de etanol caia. Porém, os investimentos em novas usinas de processamento de milho tendem a compensar boa parte dessa queda. A consultoria StoneX projeta uma diminuição de 2,5 bilhões de litros na produção de etanol de cana, mas aumento de 1,5 bilhão de litros na de etanol de milho. Com isso, aqueda, no saldo, deverá ser de apenas 1 bilhão de litros de etanol no Centro-Sul, totalizando uma produção de 33,5 bilhões de litros.

Nas contas da consultoria, o processamento do milho pode representar 28% da produção total de etanol na próxima safra. Essa dinâmica altera a composição dos custos de produção de etanol e, ao mesmo tempo, garante mais oferta de biocombustível ao longo do ano, já que as usinas de milho mantêm suas operações o ano todo, inclusive durante a entressafra da cana.
Camila Souza Ramos
Fonte: Globo Rural
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