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Brasil tem 74 milhões de hectares de excedente de vegetação nativa preservada
Outros 21 milhões de hectares em imóveis rurais precisam ser restaurados
Publicado em 09/12/2024 às 09h20
Foto Notícia
Na Bahia, são mais de 10 milhões de hectares de excedente de vegetação nativa preservada
Foto: Rogerio Albuquerque
O Brasil tem cerca de 74 milhões de hectares de excedente de vegetação nativa preservada em Reservas Legais de propriedades rurais e que são passíveis de receber pagamentos por serviços ambientais. Trata-se de áreas com preservação acima do que é exigido por lei. Por outro lado, outros 21 milhões de hectares em imóveis rurais estão pendentes de ações de restauração para regularização ambiental. O número se refere ao déficit encontrado nas fazenda de vegetação que precisa ser recuperada.

Os dados fazem parte da terceira edição do Panorama do Código Florestal, estudo feito pelo Centro de Sensoriamento Remoto (CSR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Um dos alertas dos pesquisadores é para o ritmo lento de avanço na implementação da legislação ambiental brasileira, principalmente a deficiência persistente do Cadastro Ambiental Rural (CAR).

“Se a propriedade tem percentual acima do que é exigido pela lei, o próprio Código Florestal estabelece a possibilidade de emitir uma cota de reserva ambiental, que seria o lastro para que se tenha pagamentos por serviços ambientais ou mercados de ativos florestais”, explicou o pesquisador associado do Centro de Sensoriamento Remoto da UFMG, Felipe Nunes, coautor do estudo.

Segundo a pesquisa, a Bahia tem mais de 10 milhões de hectares de excedente de vegetação nativa preservada. Em Mato Grosso, os dados oscilam entre 5,5 milhões e 7,3 milhões de hectares. Rondônia é o Estado que tem menor área de excedente preservado, com cerca de 80 mil hectares.

Falta restauração

Das áreas que precisam de ações de restauração, algo entre 16 e 19 milhões de hectares estão em Reservas Legais e de 3 a 3,4 milhões em Áreas de Preservação Permanente (APPs).

O maior déficit em Reservas Legais, proporcional à área total dos imóveis rurais, está em Rondônia, com 12,1%. Na sequência aparecem Pará (9,51%), Mato Grosso (7,6%), Acre (7,02%) e São Paulo (6,05%). Em APPs, o déficit é maior no Rio de Janeiro, com 2% da área total dos imóveis.

A pesquisa calculou os requisitos do Código Florestal e, como resultado, o nível de conformidade para cada um dos mais de sete milhões de imóveis rurais registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) .

Após 2008, indicou o estudo, 26% do desmatamento em imóveis rurais ocorreu em área de APP ou em propriedades com Reserva Legal abaixo da porcentagem mínima estabelecida pelo Código Floresta. Os Estados com maior índice foram Rondônia, Acre, Pará, Roraima e Amazonas.

Sobreposições

O estudo da UFMG indicou ainda um crescimento nas sobreposições dos cadastros ambientais rurais a outras categorias fundiárias, em especial às terras públicas sem destinação.

Na Amazônia Legal, área mais crítica, de acordo com os pesquisadores, as sobreposições desse tipo aumentaram de 12,4% para 18,3% no último ano, sendo 13.433 registros sobrepostos a unidades de conservação, 2.360 a terras indígenas e 206.495 a terras públicas sem destinação. A pesquisa mostrou também 219.879 registros com sobreposições em Áreas Protegidas de acordo com o Protocolo de Monitoramento de Fornecedores de Gado da Amazônia do Ministério Público Federal (MPF).
Deficiências do CAR

O estudo relacionou a sobreposição à ineficiência e ao uso indevido do CAR que permitem “declarações fraudulentas”. Segundo os pesquisadores, isso ocorre para esconder desmatamento ilegal, déficits de reserva legal ou mesmo para grilagem de terras, sobretudo de unidades de conservação, terras indígenas ou de povos e comunidades tradicionais e, principalmente, de terras públicas sem destinação.

Os Estados com mais registros sobrepostos a áreas protegidas são, primeiramente, o Pará, seguido de Rondônia, Amazonas, Roraima e Tocantins.

“Em 2024, após 12 anos da revisão do Código Florestal, quase nada avançou, principalmente quanto ao uso do CAR como instrumento principal para o cumprimento do Código Florestal. Esse período tem sido marcado por contratempos e limitações. A alteração legislativa afrouxou exigências relacionadas à conservação ambiental e flexibilizou medidas de fiscalização, incluindo a concessão de anistia a desmatadores ilegais, cancelamento massivo de autos de infrações e a redução da necessidade de recuperação de vegetação nativa”, disse Britaldo Soares Filho, coordenador do estudo, em nota.

Devido à predominância do processo manual baseado na interpretação visual do CAR, a análise e a validação dos registros têm enfrentado atrasos significativos, com apenas 1,8% (dos 7,3 milhões) com validação concluída até o momento.

O estudo apontou que o software que sustenta a operacionalização atual está “inadequado” para lidar com as demandas de cadastro e monitoramento do uso da terra de um país com as dimensões do Brasil.

“Trata-se de um software obsoleto, com interface pouco amigável, que opera offline sem integração de base de dados cartográficos, e limitado ao uso de imagens de satélite de qualidade inferior a outras de livre acesso disponíveis atualmente. Além disso, é um software proprietário, com código fonte fechado e indisponível. Os estados e o governo federal são incapazes de atualizá-lo, muito menos integrá-lo a outros sistemas federais. Apesar de o Brasil dispor de tecnologia e inteligência territorial gratuitas por parte de Instituições, a exemplo do modelo desenvolvido pelo CSR/UFMG, essa verificação abrangente ainda não é feita pelo Sistema atual”, afirmou Britaldo Soares Filho.

“Nesse aspecto, boa parte dos casos de sobreposição do CAR a outros imóveis, bem como o cancelamento de registros fraudulentos, poderia ser resolvida. Essa falta de progresso impacta negativamente a implementação de outros mecanismos-chave para ajudar os proprietários rurais a alcançarem a conformidade legal, tal como o Programa de Regularização Ambiental (PRA), o Mercado de Cota de Reserva Ambiental (CRA), além de mecanismos financeiros de pagamentos por serviços ambientais ou mesmo a rastreabilidade agrícola, uma exigência cada vez maior de mercados internacionais”, reforçou, na nota.



 
Rafael Walendorff
Fonte: Globo Rural
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